O “Desvio do Padrão de Consumo” no caso de Golpes Bancários e a Responsabilização dos Bancos

A tecnologia transformou a nossa rotina e, com ela, a forma como nos relacionamos e consumimos. Se, por um lado, temos acesso facilitado a produtos e serviços, por outro, estamos mais vulneráveis a situações como os golpes. Quem nunca recebeu um e-mail ou mensagem suspeita? Diante dessa realidade, vamos analisar como o Direito do Consumidor pode nos proteger, especialmente nos casos de “desvio do padrão de consumo”.

Para ilustrar o nosso escrito e destacar a importância da análise do “desvio do padrão de consumo”, vamos analisar um caso recente julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação Cível nº 1070471-15.2023.8.26.0100): Uma cliente de um grande banco, após cadastrar suas senhas, recebeu um SMS supostamente enviado pela instituição informando sobre uma compra de alto valor em seu cartão de crédito. Ao entrar em contato com o número 0800 fornecido na mensagem, foi orientada por um “atendente” a ir a um caixa eletrônico para cancelar a transação.

No caixa eletrônico, seguindo as instruções de um segundo “atendente”, a cliente trocou sua senha, digitando os números que lhe foram ditados. A partir desse momento, diversas transações foram realizadas em sua conta, resultando em grande prejuízo financeiro.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar o caso, deu ganho de causa à cliente, aplicando o Código de Defesa do Consumidor e reconhecendo a ocorrência do chamado “golpe da falsa central de atendimento”. A decisão destacou a importância da análise do “desvio do padrão de consumo” como elemento fundamental para a resolução do conflito.

A “fuga do padrão de consumo” ocorre quando o consumidor realiza uma transação que se distancia de seus hábitos e comportamentos de consumo habituais. Essa análise é crucial em casos de golpes, pois permite identificar operações suspeitas e que destoam do perfil do cliente.

No caso em questão, a troca da senha no caixa eletrônico, seguindo as instruções dos golpistas, deu início a uma série de transações fugindo do “padrão de consumo” da cliente. Essa informação foi utilizada como prova para demonstrar que a cliente foi vítima de um golpe e não agiu por livre vontade.

Sobre o tema, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também tem se posicionado de forma consistente na proteção dos consumidores, ainda mais em casos de golpes. Em um caso recente (Recurso Especial 2.052.228-DF), a Terceira Turma, sob a relatoria da Ministra Nancy Andrighi, reforçou a responsabilidade objetiva dos bancos em casos de ‘golpe do motoboy’, quando comprovada a falha na prestação do serviço, asseverando que tal falha ocorre quando o banco permite transações que fogem do padrão de consumo do cliente, como saques e transferências de altos valores em sequência. Nesses casos, o banco tem o dever de detectar a movimentação atípica e alertar o cliente, antes que o golpe seja consumado.

A decisão do STJ destaca que transações sucessivas e de valores elevados são claramente suspeitas e configuram fraude. O banco, ao não detectar e impedir essas transações, falha na prestação do serviço e deve ser responsabilizado pelos danos causados ao cliente

Então, embora cada caso apresente nuances específicas, é razoável esperar que os bancos, munidos de tecnologias como a inteligência artificial, possuam um conhecimento profundo do perfil de seus clientes. Isso permitiria identificar prontamente transações que se desviam do padrão habitual, possibilitando ações preventivas, como o bloqueio da operação ou o contato imediato com o cliente para confirmação.

É importante, sempre houver dúvida sobre casos assemelhados, consultar um advogado.

Equipe Brüning

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