Adjudicação Compulsória Extrajudicial

Breve Análise sobre aspectos da Lei nº. 14.382/2022

A adjudicação compulsória é um instituto/ferramenta de direito processual tido como fundamental na consecução do direito material da propriedade e de transações imobiliárias no Brasil. Este instrumento permite ao comprador garantir seu direito de propriedade quando todas as suas obrigações contratuais foram cumpridas, mas o vendedor se recusa ou está impossibilitado de entregar a documentação necessária para concluir a transferência da propriedade.
Para a consecução de tal instituto, o interessado deve comprovar que satisfez todas as obrigações estipuladas no contrato, o que inclui o pagamento do preço acordado e o cumprimento de outros termos pactuados. Além disso, é necessário demonstrar que solicitou a escritura pública de compra e venda ao vendedor, mas este se recusou a passá-la, ou, em outras hipóteses, quando este for falecido, for declarado ausente, for civilmente incapaz ou estiver em localização incerta e não sabida ou, ainda, quando se tratar de pessoa jurídica, esta for considerada extinta.


Do ponto de vista cronológico, o processo de adjudicação compulsória, antes do advento da Lei 14.382, era inteiramente judicial. Então, em 2022, como marco importante e dentro da necessidade de organização do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos, foi promulgada a Legislação em comento com a introdução, na Lei de Registros Públicos, do artigo 216-B autorizando-se a possibilidade de que houvesse a adjudicação compulsória também na modalidade extrajudicial. Por fim, dentro dessa gama de normatização e já no ano seguinte, o Conselho Nacional de Justiça, atento à necessidade de se regulamentar e padronizar procedimentos advindos de tal Lei, instituiu o Provimento nº 150/2023 onde, de modo bastante assertivo, tratou da regulação da adjudicação compulsória extrajudicial. Como núcleo central do ato do CNJ a intenção é a de acelerar a desburocratização do processo, transmutado agora em procedimento, permitindo que compradores, que cumpriram suas obrigações contratuais e tendo demonstrado os requisitos anteriormente indicados, solicitem diretamente ao cartório de imóveis competente a transferência do bem.


Aliás, sobre a ideia de desburocratização, lembre-se que o Código de Processo Civil de 2015 introduziu, na Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973), o art. 216-A, que regulamenta o procedimento extrajudicial da Usucapião. Então, na esteira, seria crível que a novel Lei também pudesse fazer o mesmo com o objetivo de inaugurar, no instituto em comento, um novo caminho para solucionar pendências que, antes, eram postas somente no meio judicial.
Sobre a nova lei, diz o art. 216-B que sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo. (grifos nossos).
Assim como na adjudicação compulsória judicial, na extrajudicial, o inadimplemento do contrato por parte do vendedor se revela indispensável, visto que sem isso inexiste hipótese de adjudicação compulsória. Aliás, é, em verdade, o grande fundamento que justifica o pleito do comprador em se ver declarada sua plena propriedade sobre o bem. Nesse sentido, a própria lei já estabelece esse requisito, implicando que, se o vendedor concordar em assinar a escritura, o procedimento de adjudicação se tornará sem efeito e a escritura pública deverá ser formalizada.


Ainda na seara legislativa e em complemento à Lei n.º 6.015/73, colaciono que o art. 216-B, §1º, II, diz – prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos. (grifos nossos).
Logo, a adjudicação compulsória extrajudicial diferencia-se, e em muito, dos outros procedimentos que também passaram pelo “desjudicialização” no passado. Como se sabe, no divórcio ou no inventário extrajudicial, é necessário haver consenso entre as partes acerca de suas disposições. Assim, a diferença fundamental demonstrada pela adjudicação compulsória extrajudicial é exatamente a falta de interesse/consenso entre as partes.


Observa-se que uma série de requisitos precisam de cumprimento, caso o comprador decida por requerer a adjudicação compulsória extrajudicial, como a confecção de ata notarial por tabelião de notas, seguindo a métrica da Usucapião Extrajudicial.
Para além disso, nesse novo cenário, os Oficiais Registradores de imóveis desempenharam um papel crucial. Eles serão responsáveis por analisar minuciosamente a documentação apresentada pelo comprador, verificando se todos os requisitos legais estão sendo atendidos, função esta que, antes da promulgação da lei 14.382/2022, era de competência exclusiva do Juiz de Direito.


Então, em sendo atendidos todos os requisitos do art. 216-B e incisos (LRP), o Oficial registrador deverá proceder com registro do imóvel em nome do comprador.
A mudança, como apresentada, representa uma economia significativa de tempo e custos, além de reduzir a burocracia associada ao processo, além de que, com a introdução da adjudicação compulsória extrajudicial, haverá um avanço importante no sistema legal brasileiro, com o aprimoramento da eficiência e da acessibilidade na resolução de disputas imobiliárias. Isso beneficia, é claro, compradores, vendedores e o mercado imobiliário como um todo, proporcionando segurança jurídica e facilitando a conclusão de transações imobiliárias de maneira mais eficiente.
No entanto e por fim, muito embora o novo procedimento represente uma evolução no sentido de celeridade e desburocratização de atos envolvendo o Poder Judiciário, é certo que o foro extrajudicial ainda apresenta inúmeros limites, sendo que alguns desafios ainda precisam ser superados até a plena estruturação do procedimento nas serventias registrais imobiliárias.

Por Victor Hugo Pereira, Advogado inscrito na OAB/PR sob o número 114.576 e pós-graduado em Direito imobiliário e Registral

Fontes:
1- https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm
2- https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/l14382.htm
3- https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5258

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