A Teoria da “Perda de uma Chance” e o Dever de Indenizar

Originária da doutrina francesa, a “perda de uma chance” tem como base a ideia de que a chance, em si, pode e deve ser considerada como um bem passível de indenização quando é prejudicada por uma conduta ilícita; no caso, uma eventual indenização decorrente da “perda” visa compensar a vítima pela perda de probabilidade de obtenção de um resultado favorável, ou seja, pela frustração de uma expectativa legítima.

Para aclarar um pouco o tema, alguns exemplos são necessários, sempre a depender da análise de cada caso:

  1. Se um erro médico impede que um paciente se cure de uma doença ou tenha uma sobrevida significativa, que seria provável com o tratamento adequado, pode haver indenização por perda de uma chance de cura ou sobrevida;
  2. Formulação de pergunta sem alternativa de resposta correta, na última fase de competição de perguntas e respostas, eliminando as chances de êxito do concorrente.

Para haver a caracterização de tal teoria e a respectiva indenização, sempre é necessário que se reúnam alguns requisitos:

  1. Conduta ilícita – A conduta do agente deve ser ilícita, ou seja, contrária à lei, ou em violação a um dever legal. 
  2. Nexo causal – Deve haver um nexo de causalidade entre a conduta ilícita e a perda da chance, ou seja, a perda da chance deve ser um resultado direto e imediato da conduta do agente. 
  3. Chance séria e real – A chance perdida deve ser séria e real, ou seja, não pode ser apenas uma possibilidade remota ou hipotética. Aliás, um dos maiores desafios práticos da teoria da perda de uma chance reside na comprovação da probabilidade real da obtenção do resultado favorável. Não basta alegar a perda da oportunidade; é necessário demonstrar, de forma razoável e plausível, que a chance perdida era concreta e possuía uma probabilidade significativa de se concretizar caso o ato ilícito não tivesse ocorrido. Em casos como o do erro médico, por exemplo, laudos periciais detalhados são cruciais para avaliar as chances de cura ou sobrevida.
  4. Dano indenizável – O dano causado pela perda da chance deve ser indenizável, ou seja, deve ser passível de avaliação em dinheiro e a questão aqui é se determinar o valor da indenização pela perda de uma chance é complexo. Não se indeniza o resultado perdido (a cura total, a vitória no concurso), mas sim a perda da oportunidade de alcançar esse resultado. Os tribunais costumam utilizar critérios como a probabilidade de sucesso da chance perdida e o benefício que seria auferido caso a chance se concretizasse. A indenização, portanto, será proporcional à probabilidade perdida.

A perda de uma chance é um conceito oriundo da responsabilidade civil, mas não se confunde com a disposição clássica do tema. Em outras palavras, a responsabilidade civil abrange a reparação de danos materiais e morais, incluindo a perda de uma chance, mas não se limita a ela. Objetivamente, a perda de uma chance é a perda de uma oportunidade concreta e legítima que, se não fosse pela ação ou omissão de outrem, teria sido concretizada; é a frustração de uma possibilidade futura.

Embora o texto foque na responsabilidade civil, a teoria da perda de uma chance tem sido aplicada em outras áreas do direito, como no direito do trabalho (perda da chance de uma promoção), no direito administrativo (perda da chance de participar de uma licitação), e até mesmo no direito processual (perda da chance de produzir uma prova em tempo hábil).

Por fim, é fundamental diferenciar a “chance séria e real” de meras expectativas ou possibilidades remotas. A teoria da perda de uma chance não visa indenizar frustrações vagas ou possibilidades hipotéticas, mas sim a perda de uma oportunidade concreta e palpável.

Equipe Brüning

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