Em recentes decisões, o Supremo Tribunal Federal reformou julgados de alguns Tribunais Regionais do Trabalho que reconheciam vínculos empregatícios de algumas categorias de ocupação, embora houvesse, por parte do STF, precedentes já consolidados em sentido contrário. Entre tais ocupações estão casos de médicos, motoristas de aplicativos, técnicos em radiologia, corretor de imóveis, representantes comerciais, dentre outros.
O que acontece, nesses casos, é a contratação de pessoas, físicas ou jurídicas, para exercer, dentro de uma empresa, tanto as atividades de meio quanto as atividades de fim, ressaltando-se que a primeira tem a ver com tarefas não essenciais do negócio e, a segunda, refere-se à identidade da corporação e que justifica a existência daquela entidade.
Sobre o tema o Supremo já havia reconhecido, em 2018, no julgamento de dois casos (ADPF 324 e RE 958.252) a licitude da terceirização de etapas tanto de atividade-meio quando de atividade-fim, mas, mesmo assim, os Regionais vêm, reiteradamente, descumprindo a já pacificada jurisprudência do STF com o reconhecimento do vínculo empregatício acima referido.
Em caso recente, a Segunda Turma do STF, ao julgar um Agravo Regimental (na RCL 53.688), tendo como desempate o voto do ministro Gilmar Mendes, cassou uma decisão da Justiça do Trabalho que anteriormente havia reconhecido o vínculo empregatício de um agente autônomo de investimentos com uma corretora de operações financeiras.
Entenderam os Ministros da referida Turma, por maioria de votos, que o contrato do profissional (que teria trabalhado entre janeiro de 2005 até maio de 2007 com registro em carteira de trabalho e que foi, posteriormente, recontratado através de pessoa jurídica para exercer a mesma tarefa) não poderia ser considerado como uma “pejotização” ilícita, como entendeu o Tribunal Regional da 1ª Região (Rio de Janeiro), pois a atividade é devidamente regulada pelo CVM (Comissões de Valores Imobiliários) que, inclusive, admite a atuação de agentes autônomos, ou seja, não há que se falar em contratação por PJ como sendo ilícita.
Além disso, no mesmo caso e segundo o Ministro Gilmar Mendes, não é coerente com os precedentes do STF a conclusão que impõe determinado modelo de contratação sustentado pelo Regional, sobretudo quando a decisão judicial reverte o formato de prestação de serviço escolhido pelas partes, “que rendeu ao agente, por quase uma década, rendimentos mensais por vezes superiores a R$ 100 mil”.
Ainda em seu voto destacou o Ministro Gilmar Mendes que “o Tribunal de origem declarou haver vínculo empregatício (…), não obstante a comprovada existência de acordo entre as partes (…), e a remansosa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema” e que “a bem da verdade, a Justiça do Trabalho não concorda com a compreensão constitucional do Supremo Tribunal Federal e pretende substituí-la pela sua visão do mercado de trabalho, em nítida afronta institucional.”
Aliás, sobre o tema já existem decisões em que Juízos de primeiro grau da Justiça do Trabalho se declaram incompetentes para o julgamento de tais ações sob o argumento de que eventual vício de consentimento teria que ser tratado como relação comercial, cuja atração estaria afeta à Justiça Comum Cível.
TÉCNICO DE RADIOLOGIA
Noutro caso, Cristiano Zanin, ministro do STF, afastou o vínculo empregatício entre hospital e técnico em radiologia, reconhecido pelo Tribunal Regional da 3ª Região (Minas Gerais), quando o hospital respondeu a uma Reclamação no Supremo (RCL 62.357) alegando violação aos precedentes firmados na ADPF 324 e no RE 958.252 (Tema 725 da repercussão geral).
MÉDICO
Em outro exemplo, o Ministro Edson Fachin derrubou o vínculo de emprego reconhecido entre médico contratado como PJ e hospital, feito pelo Tribunal Regional da 2ª Região (São Paulo), quando a aludida casa de saúde realizou reclamação perante o STF (RCL 61.492) sustentando a licitude da terceirização entre pessoas jurídicas, já reconhecida pelo julgamento da ADPF 324.
REPRESENTANTE COMERCIAL
Por fim, Kassio Nunes Marques, ministro do STF, derrubou o reconhecimento do vínculo de emprego decidido pelo TRT-2 (São Paulo) entre um representante comercial e uma rádio, acolhendo a tese (na RCL 57.097) de que a contratação feita por intermédio de PJ (pessoa jurídica), deu-se em razão da natureza do serviço prestado, e que, além disso, o representante comercial costumeiramente se apresentava e oferecia seus serviços ao mercado como PJ.
Enfim, como se viu, o Supremo Tribunal Federal vem consolidando sua jurisprudência no sentido de que é possível a terceirização de serviços da atividade-fim em empresas, mesmo a despeito do descumprimento, de tal posicionamento, por parte de algumas Instâncias da Justiça do Trabalho.
Artigo do Advogado Fellipi Edward Queiroz de Lima- OAB/PR – 64.576, Especialista em Direito do Trabalho